domingo, 27 de dezembro de 2015

Desistir, jamais!



24 de dezembro de 1988
Todos os moradores da pequena cidade de Monte Alegre estavam em festa. 
Era noite de Natal e, na casa de seu Benedito e dona Maria, havia um motivo a mais para comemoração. Acabava de nascer seu segundo filho, um menino lindo, que por sugestão de sua irmã Carla, recebeu o nome de Jesus.
Seu Benedito, um sujeito simples, trabalhava como gari; se realizava com um mero sorriso das pessoas que passavam por ele, sempre apressadas. 
Dona Maria, uma mulher batalhadora e companheira, mesmo nos momentos difíceis, mantinha a alegria e uma palavra de fé e otimismo. Era a conselheira do bairro, por isso, a sua casa estava sempre cheia.
Carla, uma menina meiga, vivia cantando e sentia muito orgulho de seus pais. Sonhava em ser médica para poder curar as pessoas. Aquela família humilde e sem muitas ambições era querida por toda a vizinhança. Seu Benedito e dona Maria não mediam esforços e trabalhavam muito para um dia verem a filha formada.
16 de dezembro de 1998
O tempo passou rapidamente sem pedir licença. Carla, como toda adolescente, levava uma vida feliz. Vivia rodeada de amigos, festejando e alegrando as pessoas.
Jesus acordava todos os dias, com a cantoria da sua irmã, que parecia uma cantora profissional, e com o cheiro do café da sua mãe, que para ele era o melhor café do mundo. À mesa do café da manhã, ouvia as músicas caipiras ao lado do pai e suas gargalhadas intermináveis. Para seu Benedito tudo era engraçado.
17 de dezembro de 2000
O dia mais esperado para a família de seu Benedito, finalmente chegou. O dia da formatura de Carla. Nesse dia, o sol resolveu nascer mais cedo, para dar bom dia ao seu Benedito. Ele foi trabalhar com um largo sorriso no rosto. E em meio à poeira e ao lixo, ele era a pessoa mais feliz do mundo, pois, valorizava todos os momentos da vida. Fazia questão de contar aos amigos sobre a emoção que estava sentindo.
À noite, Carla estava radiante e não parava de cantar. Sabia que em breve estaria iniciando o ensino médio e se esforçaria ao máximo para tentar realizar seu sonho. Seu irmão só observava aquele momento mágico da sua família. Ele achava muito engraçado a indecisão do pai quanto à escolha da roupa. Para Jesus, aquele momento poderia durar eternamente.
Mas foi nessa noite, que Jesus descobriu, que nada dura para sempre. Foi quando a lua se recusou a aparecer, talvez não querendo presenciar aquele terrível momento para a sua família. O momento que mudaria para sempre a sua vida e a vida do seu pai. A lua, antes companheira, não quis ser testemunha de tanta dor.
A caminho do clube aonde seria realizada a formatura, um carro dirigido por um jovem bêbado que estava fazendo racha com os amigos, tirou a vida da jovem Carla e da sua mãe. Pela primeira vez, Jesus viu seu pai chorando. Era uma cena horrível, surreal.
Aos doze anos de idade, Jesus descobriu que a vida não era tão perfeita como ele imaginava e que a dor existia e estava muito perto, só esperando a hora certa para se instalar em seu coração. Ele viu o tempo passar e levar embora sua infância e seus sonhos.
10 de fevereiro de 2002
Seu Benedito perdeu a fé e desistiu da vida. Largou o emprego e se entregou à bebida.  Muitas vezes passava a noite caído em frente ao bar ou voltava para casa carregado pelos amigos.
Jesus só se alimentava com a sopa da escola e era motivo de chacota pelos colegas. Ele andava com o sapato furado e a calça rasgada. Seu pai se tornara um boêmio, quase nem se alimentava mais.
Então, Jesus resolveu sair da escola e começou a trabalhar numa oficina que ficava ao lado da sua casa. Muitas vezes chorava quando via seu pai, seu herói, o homem com o maior coração do mundo, se acabando aos poucos com a bebida.
Jesus não entendia porque a vida estava sendo tão cruel com seu pai, um homem praticante do bem. Seguindo os conselhos de uma cliente da oficina, Jesus foi à igreja para acalmar a dor do seu coração. Quando entrou, estranhou o que viu pela frente, o lugar era grande e luxuoso, não era o lugar simples que sua mãe sempre dizia ser a casa de Deus. Ele notou que as pessoas estavam todas bem vestidas e olhavam de soslaio para ele. Talvez, pela barba que estava grande ou pela roupa velha, quem sabe!
Tudo o que ele queria, naquele momento, era ouvir uma palavra amiga, receber um gesto de amor. Na saída, ainda esperou um pouco para ver se alguém se aproximava dele, mas em vão. Enquanto as pessoas se dirigiam aos belos carros no estacionamento, passavam por ele sem notá-lo.
Com o dinheiro que ele ganhava na oficina e com a ajuda do seu patrão, pôde colocar e manter o pai numa clínica de recuperação.
21 de dezembro de 2005
Com muitas dificuldades para conseguir algo melhor, aos dezoito anos, Jesus voltou a estudar e foi quando conheceu a garota da sua vida.
Paula era uma garota linda, com um belo sorriso e um coração enorme. Ela despertou nele um sentimento que há muito tempo havia sumido. Era um sentimento bom que fazia seu coração bater mais forte e feliz.
Paula ajudou-o a superar seus traumas da época do colégio e o que parecia impossível tornou-se real, ele terminou o ensino médio. Ela mostrou para ele que os desafios da vida valem a pena e não se deve nunca deixar de sonhar; e que os estudos tinham apenas começado.
Tendo Paula como a sua grande incentivadora, Jesus entrou para a faculdade, conseguiu um bom emprego e mais tarde, casou-se com ela. Seu Benedito estava recuperado e orgulhoso do filho. Eram companheiros um do outro. Formaram uma bela família.
16 de dezembro de 2013
Mesmo com muitas dificuldades, Jesus conseguiu se formar. Afinal, não era fácil trabalhar e estudar. Sua alegria ficou ainda maior, quando soube que seria pai.
Quando seu Benedito recebeu a notícia de que seria avô de uma menina, não se conteve, desmanchou-se em lágrimas.
O sol nasceu mais cedo para contemplar aquele dia maravilhoso e sorrir para seu Benedito. Ele estava muito feliz, com os olhos cheios de lágrimas. Agradeceu a Deus por tê-lo mantido em pé, mesmo depois dele ter perdido a fé.
Deus deu a ele uma nova chance para poder presenciar aquele momento, a formatura do filho amado. Mostrou que a pessoa deve acreditar sempre, mesmo nas horas mais escuras, em que tudo parece estar perdido.
Durante a festa de formatura, o abraço que Jesus deu no pai fez com que o tempo parasse e trouxesse de volta à lembrança, a imagem da mãe e da irmã. As lágrimas que cobriam o rosto dele se transformaram em sorrisos e todos aplaudiram.
Doutor Jesus acordava cedo todos os dias, ouvindo a cantoria da sua filha que recebeu o nome de Carla e com o cheiro delicioso do café de Paula, sua esposa. Sentia a maior felicidade do mundo quando sentava para tomar o café da manhã ao lado do pai, ouvindo as músicas caipiras e suas gargalhadas. 

Colaboração de P.W.M.


domingo, 20 de dezembro de 2015

Coragem e determinação



Uma mulher além do seu tempo. Desde jovem, sempre foi batalhadora. Começou a trabalhar muito nova como doméstica, aos quinze anos de idade. Ajudou o cunhado a conseguir emprego e sempre foi muito prestativa com a família. Quem conheceu Vanda, sabe o quanto sua vida foi difícil.
De doméstica, passou a trabalhar no restaurante da empresa que havia no lugar onde morava. E foi nesse restaurante que ela conheceu Ramiro, o amor da sua vida. Começaram a namorar e juntos batizaram a filha mais velha de uma das suas irmãs.
Estavam planejando o casamento, quando Ramiro foi transferido para outra cidade. Ele pediu à Vanda que o esperasse. Dentro de um ano ele voltaria para buscá-la.
Apesar do amor que sentia por Ramiro, a distância que os separava fez com que Vanda não aguentasse ficar sozinha. Com a falta de comunicação, Vanda pensou que Ramiro havia se esquecido dela. Já passara mais de um ano desde o dia em que se despediram.
Ela conheceu Adalberto e começaram a namorar. Não estava apaixonada por ele como estava por Ramiro, mas como ele era um moço bonito e jeitoso, acreditou que se apaixonaria pelo jovem.
Ramiro, um homem de palavra, voltou algum tempo depois do combinado; infelizmente, tivera um contratempo. Quando chegou foi logo procurar a sua amada, mas, acabou pegando-a com outro. Ficou decepcionado. Ele voltou para oficializarem o casamento e ela não manteve a palavra de que ficaria esperando por ele.
Muito chateado, Ramiro foi embora sem perdoá-la. Iria casar com a primeira moça que encontrasse pela frente, quando chegasse na sua cidade. E foi o que aconteceu. Assim que retornou, encontrou Laura na rodoviária e depois de uma longa conversa, começaram a namorar.
Um ano depois, Ramiro estava casado com Laura e juntos começaram a construir a fortuna que têm hoje. Tiveram apenas um filho.
Enquanto isso, Vanda terminou o namoro com Adalberto, porque não conseguiu se apaixonar por ele. Resolveu tentar um novo relacionamento, dessa vez com o irmão de um dos seus cunhados.
Resolveram casar e foram morar na casa desse cunhado, que arrumou um quarto para os dois. Mas, o casamento durou apenas um mês. Vanda percebeu que Valdomiro era muito diferente dela. Era um homem muito sossegado e sem ambição.
Algum tempo depois, ela conheceu Manoel, um pedreiro que apareceu na cidade e começaram a namorar. Como era separada, foi morar com ele sem papel assinado. Dessa união, que durou pouco mais de um ano, nasceu Henrique.
Sua vida mudou radicalmente. Ela foi tentar a sorte na cidade grande. Voltou a trabalhar como doméstica e além da casa que tinha para dar conta, precisava cuidar do filho pequeno. Sorte sua que a patroa era uma pessoa boa.
Para uma moça que havia nascido no interior e com pouco estudo, Vanda estava se saindo muito bem na capital. Conseguiu cativar os patrões, que apesar de exigentes, aceitaram que ela ficasse com o filho até que ele completasse um ano. Depois disso, Vanda deveria colocá-lo numa creche para passar o dia.
O menino foi crescendo e muitas coisas foram acontecendo. No período em que ele ficava em casa, se quebrasse alguma coisa, a patroa descontava do salário dela e Vanda não tinha alternativa, senão aceitar, sem reclamar das novas exigências.
Chegou o dia, em que Henrique já se tornara um rapazinho e ela resolveu voltar para sua cidade. Já tinha juntado algum dinheiro e poderia abrir um negócio próprio. Um de seus irmãos se associou a ela e juntos abriram um pequeno comércio.
Com o dinheiro que sobrou, ela conseguiu comprar um terreno e construir uma casa pequena. Era suficiente para ela e o filho. Vanda não media esforços para criar seu herdeiro. Era uma mulher batalhadora, determinada e incansável!
Quando o comércio parou de dar lucro, ela conseguiu emprego na empresa onde havia trabalhado no passado e foi uma funcionária exemplar. Pontual e responsável, fazia seu trabalho com amor. Conquistou a amizade de várias pessoas, na chefia.
Voltou a reencontrar seu antigo e talvez único amor, Ramiro e ficaram amigos. Mas, nunca mais se interessou por outro homem. Para ela, a vida era apenas trabalho e seu filho. Seu tempo era precioso e bem dividido entre os dois.
Vanda dizia o que pensava, era direta, não mandava recados. Às vezes, chegava a ofender determinadas pessoas, que não compreendiam a sua maneira de ser. Achavam que ela era intrometida, que não tinha papas na língua.
Seu filho casou-se e formou a sua própria família. Vanda aposentou-se e passou a dedicar seu tempo aos cuidados da casa e do quintal. Gostava de flores e cultivava algumas espécies. Tinha, também, uma pequena horta. 
Henrique morou um bom tempo longe da mãe e depois retornou com a família para morarem com ela. Como filho único, não poderia deixar a mãe sozinha na velhice. Ele teve filhas e netos, uma família grande e bonita.
Com a idade avançando, Vanda foi se tornando cada vez mais cri-cri e implicante. Até mesmo com a família e alguns vizinhos. Mas, sempre trabalhadeira e organizada. 
Conforme os anos foram passando, ela foi perdendo os irmãos, um a um. Sabia que restara apenas um meio irmão que morava na capital. O contato entre eles foi perdido com o passar dos anos.
Continuou mantendo contato com Ramiro, que de vez em quando vinha visitá-la. Ele, ainda, era um homem forte e vigoroso. 
Para Vanda, chegou o dia em que seu corpo, talvez, cansado da labuta de anos a fio, começou a se entregar. Falava pouco e as poucas palavras eram sobre a época de juventude, que lembrava com saudades.
Depois de uma cirurgia pela qual passou, foi ficando cada vez, mais debilitada. Suas pernas foram fraquejando e a depressão tomou conta dela. A luz do sol ardia em seus olhos. Qualquer barulho a incomodava. Só queria dormir!
Mesmo com toda a assistência que teve, seu corpo se recusava a reagir. Numa certa manhã, quando estava sendo levada para o banho, deu o último suspiro nos braços do filho amado. Seu sofrimento chegara ao fim.
Aquela mulher guerreira e corajosa que enfrentou algumas batalhas para criar seu filho deixou para a família um grande exemplo.




domingo, 13 de dezembro de 2015

Para sempre



Resolvi vir a São Paulo e começar uma nova vida. Depois de tantas decepções, recomeçar para mim era primordial. 
Trabalho numa empresa que exige muita dedicação e sem paradeiro. Um dia aqui e outro acolá! 
Tive um relacionamento que durou mais de quatro anos, com um rapaz mais jovem e já morávamos juntos, uma convivência boa, sempre mantendo o amor em primeiro plano. Um dia, fui surpreendida com o término do nosso relacionamento. 
No início, a tristeza se abateu sobre mim. Quem gosta de ser trocada por outra? Mas, me mantive firme, afinal, a vida continua e foi o que fiz. Tentei levar adiante com a cabeça erguida.
Meus amigos sempre me apoiando, dando força, me consolando. Me amparando com muito carinho. Assim toquei a vida até que, na mesma empresa em que trabalho, conheci um rapaz chamado Lorenzo; que por ironia do destino, ocupava o mesmo cargo que eu. 
Ele, também, viajava muito. Foram encontros e desencontros e apesar dessa correria, fomos nos conhecendo melhor a cada dia. 
Lorenzo era uma pessoa maravilhosa, um homem completo. Não deu outra, acabei me apaixonando. Fiquei surpresa comigo mesma. Depois de tanto sofrimento, pensei que jamais estaria aberta para um novo amor. 
Fizemos muitas viagens a trabalho, juntos. Uma nova vida que Deus me proporcionava. Mais uma chance de ser feliz. 
Nosso relacionamento, no trabalho, era de muita intensidade, nos doávamos muito pelo que fazíamos. Eu e Lorenzo, cada dia, mais apaixonados e sentindo falta de estarmos juntos. Veio, então,  a decisão do namoro sério. Que felicidade! Namoramos e nos casamos. Um casamento lindo com muitos amigos ao nosso redor. 
Deus nos abençoando com uma convivência feliz e honrada. Lorenzo era o homem perfeito, eu o amava mais e mais a cada momento. 
Passamos o primeiro ano de casados, o segundo ano, e a cada ano uma renovação sem explicação para tanto amor. Nós estávamos muitos felizes! Um complementava o outro; como dizem, ele era a metade da minha laranja.
Numa tarde, Lorenzo passou mal e o médico rapidamente realizou vários exames. Para nossa infelicidade, no diagnóstico  estava escrito leucemia. 
Um choque na família, parecia que eu não tinha chão. Encarei a situação da melhor maneira que pude, porque, Lorenzo não podia se abater, desanimar. Ele precisava da minha força. 
Começaram os tratamentos, procedimentos de quimioterapia e rádio, uma situação horrível.  Dias e mais dias, dores e sofrimentos. 
Muitas vezes, cheguei a me perguntar, porque comigo? Encontrei o amor da minha vida e Deus quer tirá-lo de mim? Quantas perguntas sem respostas! 
Vivemos por meses essa triste situação e a cada dia, uma esperança de que tudo iria passar. Lorenzo ficaria bem e voltaria a ser o homem de sempre. Acreditávamos na sua cura.
Lorenzo já estava afastado da empresa, não tinha mais condições física e psicológica. Mas, mesmo assim, quando se sentia melhor, lá estava ele com seu notebook, dando sua colaboração ao trabalho.  Ele chegou a me fazer a proposta de uma possível separação, para que eu não sofresse. 
Jamais eu concordaria com isso. O amor estava acima de tudo. O que eu mais queria era  estar ao seu lado em cada momento que Deus me permitisse. 
Todos os tratamentos foram em vão. Ele precisou ficar internado, pois, já estava muito fraco. 
Numa manhã cinzenta, recebi a pior notícia da minha vida. Deus o havia transportado para outra dimensão. Que desespero! Mesmo consciente de que ele partiria em breve, diante àquela notícia senti uma enorme revolta.
Como reagir perante tanta dor ao perder quem você ama? A vida para ele estava apenas começando; nosso casamento e nossos objetivos interrompidos por uma doença que não sente pena de ninguém.
Hoje, continuo trabalhando, viajando e tentando esquecer essa dor. Uma dor que é tão difícil de ser suportada por nós, seres humanos. 
Sei que ele está no céu com nosso bondoso Deus. Acredito na ressurreição em Cristo. A saudade nunca passará, ela faz parte do nosso amor e da certeza que, um dia, nos encontraremos!

Colaboração de L.T.A.

domingo, 6 de dezembro de 2015

Separados pelo vício



Quando o vício vence o amor, quem perde são as pessoas! Perde-se o respeito, a convivência, a alegria de viver, o calor humano e por aí afora. A família é desfeita!
Com Afonso, aconteceu tudo isso e muito mais. Rapaz que cresceu tendo maus exemplos dos pais; começou a beber quando ainda era adolescente. Transformou-se num homem trabalhador, um ótimo mecânico. Casou-se com uma moça mais velha e juntos construíram uma bela casa.
Nadir, além de professora, era uma excelente dona de casa. Uma mulher prendada; tudo o que fazia era bem feito, com muito capricho. Ela cuidava do marido com carinho. Antes de sair para o trabalho, gostava de preparar o café da manhã para tomarem juntos.
Mas, Afonso começava o dia, tomando uma dose de cachaça que costumava deixar ao lado da garrafa de café. Sua esposa não gostava daquela cena, que se repetia todas as manhãs.
As tentativas para arrumarem um filho foram muitas. Nadir pensava, que se tivessem uma criança em casa, Afonso abandonaria a bebida.
Infelizmente, todas as tentativas foram em vão. Ela quis, então, adotar um bebê; porém, Afonso foi contra.
Três anos de casados  e como Nadir estava cansada daquela vida, resolveu sair de casa. Eles não tinham vida social, pois, a preocupação dela era o mau comportamento do marido, relacionado à bebida.
Ela foi morar numa cidade próxima, devido ao trabalho. Dois meses depois, Afonso foi atrás dela e prometeu que pararia de beber se ela voltasse para casa.
Nadir, como toda mulher apaixonada, acreditou nas promessas e deu mais uma chance ao marido. Ele conseguiu cumprir a promessa por um ano. Pelo menos ela pensava que sim, não via mais a garrafa de cachaça ao lado da garrafa de café.
No final daquele ano, quando tudo parecia bem entre eles, nas festas do final de ano, Afonso esqueceu a promessa e voltou a beber. Tomou o maior porre e fez a esposa passar vergonha diante da família.
Na manhã seguinte, Nadir arrumou suas coisas e mais uma vez, deixou o marido. Foi passar as férias na casa da mãe que morava noutro estado. Disse a ele que na volta alugaria uma casa, não ficaria mais ali.
Mais uma vez, seu coração a traiu. No final das férias, Afonso foi buscá-la e ela o perdoou. Assim, entre idas e vindas, viveram por mais alguns anos. Era difícil para ela resistir ao apelo dele.
Para Afonso, manter a promessa de ficar sem a bebida, foi se tornando difícil. Ele começou a beber escondido da esposa, até o dia em que ela o pegou em flagrante. Numa última tentativa, sugeriu que ele fizesse um tratamento para abandonar o vício. Sugeriu que ele se internasse numa clínica para fazer um tratamento.
Enquanto Nadir, tinha esperança de que o amor que sentia pelo marido fosse capaz de curá-lo, fez tudo o que podia. Até o dia, em que percebeu que a dependência dele, era maior que o amor que ele sentia por ela.
Estava cansada de acreditar nas falsas promessas, de dar a ele mais uma chance  e pediu o divórcio. A princípio, Afonso relutou, mas como Nadir saiu de casa e foi morar perto da sua mãe, acabou concordando.
Ela abriu mão da casa; os bens materiais não eram importantes, o que desejava era sossego. Sabia que com seu trabalho, poderia viver bem e com o apoio da família tudo daria certo.
Afonso ficou, completamente, desiludido com o fim do casamento. A bebida passou a fazer parte constante, não apenas dos seus dias, mas, também das suas noites. Foi relaxando no trabalho até que fechou o oficina por falta de clientes. Ninguém confiava mais nos seus serviços.
A casa, antes tão arrumada e organizada foi se deteriorando. A sujeira foi surgindo dentro e fora do ambiente. A família procurou ajudá-lo sem sucesso. Ele passava o tempo com uma garrafa de cachaça na mão.
Quando o dinheiro acabou, Afonso começou a trocar utensílios da casa e peças da oficina pela bebida. A dependência foi aumentando e se ele tinha uma garrafa de cachaça, nada mais importava. Às vezes, comia um prato de comida na casa dos familiares.
Passou a viver como um andarilho, sua mente foi dominada por ilusões, acompanhadas de alucinações. Vozes passaram a ser ouvidas por ele, as vozes de seus falecidos pais.
Sua vida estava completamente comprometida! Nem a família o reconhecia mais. Afonso era um homem perturbado, que sobrevivia, graças a ajuda que recebia de algum parente.
Tornou-se a sombra do homem que foi um dia!
Seria diferente, se no momento que Nadir ofereceu-lhe ajuda, ele tivesse aceitado? 
Se ele optasse pela família e controlasse o vício, talvez, esta história terminasse com um final feliz.