terça-feira, 22 de agosto de 2023

Apenas uma visita



 


Todos os dias ela espera que alguma das suas colegas e amigas, de longa data, apareça. Seu dia começa como todos os outros, numa rotina estabelecida pela necessidade atual. Ela conta com ajuda para se arrumar, tomar seu desjejum e ser levada para a sala, onde a tevê a espera. Ali ela passa a manhã e a tarde, deitada. Na hora do almoço a colocam sentada. 

Ela tem a companhia da família, mas espera por uma amiga para distraí-la de vez em quando.

Segunda-feira, ninguém aparece. 

- Segunda não é dia de visita, mamãe, diz o filho.

- Quem sabe amanhã alguém vai aparecer, ela pensa.

A terça-feira chega e passa sem que ninguém apareça.

- Que dia será amanhã, ela se pergunta.

Quarta-feira, mais um dia de longa espera.

- Será que minhas amigas se esqueceram de mim?

Quinta-feira, a programação da tevê está muito chata.

- Mamãe, pode ser que amanhã apareça alguém.

A sexta-feira chega e vai embora sem que nenhuma amiga a surpreenda.

Final de semana ela tem a certeza de ninguém vai aparecer.

Ela sabe que todas as amigas têm seus compromissos, porém espera assim mesmo que uma delas tenha um tempo livre.

A saudade das boas conversas e risadas é grande.

Ela sabe que seu tempo de alegria ficou no passado.

Seu presente é tenebroso, até mesmo as lembranças estão abandonando-a.

Suas forças já a deixaram.

Seus olhos enxergam pouco.

Sua voz está perdendo a tonicidade.

Já não é ela quem escolhe a roupa que vai vestir. 

As amigas e colegas de trabalho ainda permanecem num canto da memória.

Pode ser que logo as esqueçam. Se ela ficar muito tempo sem vê-las, provavelmente é isso que vai acontecer. A cada dia sua memória vai se perdendo. Os dias da semana são lembrados por algum familiar que ao se aproximar dela os proferem.

Não lembrar de algumas coisas, até as mais simples do cotidiano é muito ruim. O que a faz esperar pelas amigas é a vontade de ouvir delas as histórias que vivenciaram ao longo do tempo, enquanto colegas de trabalho ou companheiras de uma vida.

Enquanto se lembrar delas vai continuar esperando por elas. Irá passar o dia no sofá da sala com a tevê ligada em qualquer programação, com a esperança de ouvir uma batida na porta e seu nome ser chamado como em outros tempos.

 

 

A lista (Oswaldo Montenegro)

 

 

Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você já não encontra mais

Faça uma lista dos sonhos que tinha
Quantos você desistiu de sonhar
Quantos amores jurados pra sempre
Quantos você conseguiu preservar

Onde você ainda se reconhece
Na foto passada ou no espelho de agora
Hoje é do jeito que achou que seria
Quantos amigos você jogou fora

Quantos mistérios que você sondava
Quantos você conseguiu entender
Quantos segredos que você guardava
Hoje são bobos ninguém quer saber

Quantas mentiras você condenava
Quantas você teve que cometer
Quantos defeitos sanados com o tempo
Eram o melhor que havia em você

Quantas canções que você não cantava
Hoje assovia pra sobreviver
Quantas pessoas que você amava
Hoje acredita que amam você

Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você já não encontra mais

Quantos segredos que você guardava
Hoje são bobos ninguém quer saber
Quantas pessoas que você amava
Hoje acredita que amam você

 

 Grata pela visita,

  Cidália.