Ao passar pela rua dela, Anita a vê sentada no degrau da
escada brincando com o cachorro. Anita não para, está de carro com o marido.
Porém, aquela cena não sai da sua cabeça.
Provavelmente ela está cansada de ficar mofando dentro de
casa com tanta chuva e está aproveitando para pegar um solzinho. Como não tem
com quem conversar, ela conversa com o cachorro. Ele é o único que a ouve.
Enquanto o vaivém nas ruas é intenso na pequena cidade, por
conta das promoções do mês, ela está lá em seu refúgio sem ter o que fazer.
O único passo que ela dá é até a área da frente, onde
senta-se para tomar um sol de vez em quando. Nem até o portão ela caminha mais,
pois suas pernas estão bambas. Ela sente-se desnorteada.
Quem é que se preocupa com ela? Nem ela mesma se preocupa
consigo. Ela não vive, apenas sobrevive.
Anita imagina o que passa na mente daquela, que um dia foi
uma pessoa ativa, trabalhadeira e vaidosa. Onde foi parar aquela mulher? O que
a fez desistir de si?
Será que ela não sente saudade da pessoa que foi outrora?
Ela poderia estar, como tantas outras da sua idade, fazendo alguma academia.
Poderia estar organizando uma viagem com as amigas.
Por falar em amigas, onde elas foram parar? Ela não fazia
parte de nenhuma rede social. Ela sequer fazia ideia do que vinha a ser
curtidas e seguidores. Ela não tinha celular ou computador.
As “amigas” esqueceram dela. Ela lembrava de algumas, mais
chegadas. Sabia que umas tinham se mudado para outra cidade. Mas, e aquelas que
continuavam morando nas proximidades? Será que tentaram se comunicar com ela?
Anita pensa naquela mulher e imagina como seria a sua vida
se ela estivesse participando das redes sociais. Certamente ela teria centenas
de “amigos”, mesmo que tudo não passasse de uma doce ilusão. Muito melhor do
que estar ali, sozinha, sem ter com quem conversar.
Nas redes sociais ela poderia se distrair ao invés de ficar
ali jogada às traças.
Pena que Anita não podia fazer nada por ela. Anita não
fazia parte da família, não podia se intrometer. Anita podia somente observar e lamentar cada vez que a via. Ela havia desistido de ser feliz.
O que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesmo.
Grata pela visita!
Um abraço,
Cidália.