O que ela fez com a sua vida? Deixou-se levar pela vontade
dos outros e perdeu o ânimo, a coragem. A lembrança da mulher determinada e
vencedora tornou-se remota e em breve desaparecerá completamente da sua
memória.
Presa na sua rotina sem graça ela passa pelos dias,
semanas, meses a fio. Sente-se como um animal enjaulado. As pernas começam a
atrofiar por falta de uma atividade física. Para levantar do sofá ela encontra
dificuldades. Não tem a ver com a sua idade. Muitas mulheres idosas, colegas de
outrora, ainda viajam, dançam, praticam atividades físicas.
Às vezes no meio do dia ela toma um banho para se refrescar
e veste uma blusa de pijama. A vaidade foi embora há muito tempo. Abandonou-a.
Dentro do seu guarda roupas, não tem nenhuma peça que a agrade. As roupas que
estão ali não foram escolhidas por ela. Quando foi a última vez que comprou
algo para si?
O calor é intenso e ela não encontra o ventilador. Devem
ter levado dali. Ela pega uma revista para se abanar. Usa-a como se fosse um
leque. Pelo menos havia uma revista por ali. Alguém a deixou no sofá. Ela
folheou-a procurando uma notícia interessante. De repente se deu conta, ao
olhar a data, que a revista era velha. Volta, então, a usá-la como leque. A
revista é mais útil dessa maneira.
Seus cabelos desalinhados e embranquecidos rejeitam o
pente. Ou será a sua mão que não tem mais firmeza para segurar o pente e
pentear seus cabelos? Os fios estavam embaraçados. Ela para de tentar
ajeitá-los para se abanar.
Batem na porta nessa tarde quente de verão. Ela ouve seu
nome. Não se importa que está vestida com a blusa do pijama. Vai atender a
porta. Coloca a revista debaixo do braço para liberar a mão. O pente continua
na outra mão.
Ela recebe as amigas com um leve e cansado sorriso. Um
misto de alegria e alívio.
- Que bom que vieram me ver, eu estava pensando em vocês.
Uma das amigas vendo o pente em suas mãos, pega-o e penteia
seus cabelos com facilidade. Enquanto isso conversam relembrando os bons
momentos do passado. Querem alegrá-la, distraí-la um pouco.
Ela fica perdida ouvindo a conversa das duas, olhando para
uma e outra sem entender nada.
- Vou me intrometer no assunto de vocês, mas sobre o que
vocês estão falando mesmo?
As duas amigas tentam fazê-la participar da conversa. Em
determinados momentos ela ri, parece entender sobre o que estão falando. Ela
procura participar comentando sobre alguns fatos.
Em outros momentos ela fala coisas sem nexo. Parece que
fala qualquer coisa apenas para participar da conversa.
Ao lhe perguntarem sobre sua saúde, ela diz que não tem
doença nenhuma. Não toma nenhum medicamento.
- Então, por que você não sai para passear, para caminhar
um pouco, ver gente? - pergunta uma das amigas.
Ela responde que não tem vontade. Desde o dia que perdeu o
direito de cuidar de si, perdeu também o estímulo, o desejo, a iniciativa.
Talvez ela nem consiga mais sair sozinha. As pernas estão
perdendo as forças. A visão começa a ficar turva. A catarata está cobrindo seus
olhos. Essas coisas são notadas e não faladas pelas visitantes.
Ela comenta que acredita que ninguém sente a sua
falta. Ninguém a procura exceto as duas que estão sempre ali. Por onde andam àquelas que se diziam amigas? Provavelmente, entretidas com suas atividades diárias.
-E seus filhos? - Uma delas quis saber.
-Meus filhos têm seus afazeres, suas ocupações, não podem
ficar o tempo todo comigo. Quando eles têm tempo aparecem por aqui.
Geralmente, quando ela está enjoada da televisão, olha pela
janela para acompanhar o movimento da rua. Olhar o trânsito ajuda-a a passar o
tempo. É um ótimo entretenimento. Às vezes ela conta os carros que passam, como
se estivesse contando carneirinhos quando perdia o sono.
Outra coisa que ela faz é conversar com o cachorro, que
sempre esquece o nome, para ouvir a própria voz. Com o cachorro como ouvinte
ela fala coisas do passado. Repete a mesma história. O cachorro não reclama. É
um bom ouvinte.
Quando as amigas chegam ela não tem assunto para conversar.
Suas amigas conhecem de cor e salteado as suas histórias. Ela prefere ouvir as
novidades do mundo lá fora. Novidades que entrarão por um ouvido e sairão por
outro. Sua memória não retém mais como antigamente.
Não reclama de nada. Foi ela quem se permitiu àquela vida.
Agora não pode mais voltar atrás. Ou talvez, quem sabe, não tenha força para
reagir. O isolamento tornou-se cômodo.
As amigas prometem levá-la para passear. Ela diz que vai
aguardar pelo passeio. Se as pernas permitirem.
Quem sabe sua alma, aparentemente morta para o mundo,
reencontra a vontade de viver?
Suas amigas vão embora muito tristes por vê-la desanimada. Será que ainda há esperança para aquela pobre mulher? Ela precisa reagir. Lá fora existe vida. Ela tem que observar o vai e vem de pessoas que transitam pela cidade nas tardes ensolaradas.
Adoro ler histórias e quero sempre saber o desfecho! Parabéns Cidália!
ResponderExcluirObrigada, Catarina, pelo comentário!!
ExcluirAbraços!
Cidália mas um belíssimo conto que você traz, é muito triste quando a pessoa perde o ânimo e a coragem, aguardando a continuação da história bjs.
ResponderExcluirObrigada, Lucimar, pelo comentário!! Este texto é apenas uma reflexão, não vai ter continuação. Obrigada pelo apoio e carinho de sempre!!
ExcluirAbraços!
É Muito triste quando chegamos a velhice sem ter ninguém pra nós dar pelo menos um pouco de carinho quem sabe se os filhos procurassem anima-la ela poderia sair dessa depressão! ! Adorei a história que poderia acontecer com qualquer pessoa parabens vc escreve maravilhosamente bem
ResponderExcluirPois é, Cleuza, quantos idosos passam por uma situação semelhante!! Obrigada pelo comentário e carinho de sempre!
ExcluirAbraços!
Eu espero que ela vá se aventurar sim! É muito triste como vemos idosos em nossas próprias famílias que as vezes tem certas dificuldades e são deixados, infelizmente. Tomara que ela saia sim! Gostei demais do começo de Desalento e quero continuação, amei!
ResponderExcluirFico feliz sabendo que você gostou deste texto, Daiana, mas é apenas uma reflexão, não terá continuação. Pelo menos, por enquanto!! Obrigada pelo apoio e carinho!
ExcluirAbraços!
Que triste perder o brilho, a vontade de viver, perder o ânimo. O que será que causou tudo isso nela né? Espero que tudo fique bem. A visita das amigas é muito importante tbm!
ResponderExcluirNem fale, Vany! Ela perdeu o direito de administrar a sua vida e a depressão se apossou dela. Obrigada pelo comentário!!
ExcluirAbraços!
Adoro ler estas historias fico louca pra saber oque vem depois rsrs adorei amiga continue
ResponderExcluirObrigada, Melaine, pelo apoio e carinho!!
ExcluirAbraços!
Essa é uma realidade que infelizmente acontece com muitos idosos, solidão, depressão, falta de ânimo para viver. Espero que nossa protagonista consiga superar essa fase e se abra para novas possibilidades de felicidade☺
ResponderExcluirÉ verdade, Patrícia, enquanto alguns fazem de tudo para curtir a velhice, outros se entregam à solidão. Obrigada pelo comentário e carinho de sempre!!
ExcluirAbraços!
Fiquei curiosa em saber como continua esse conto.
ResponderExcluirbig beijos
Oi, Lulu, esta história é somente uma reflexão, pelo menos por enquanto, não terá continuação.
ExcluirObrigada, big beijos!
Triste realidade de muitas pessoas, quando chegam a certa idade! bela reflexão
ResponderExcluirMuito obrigada pelo comentário!!
ExcluirAbraços!
Muita bacana a história aguardando as próximas aventuras.
ResponderExcluirMuito obrigada pelo comentário!!
ExcluirAbraços!
Que texto lindo e triste ao mesmo tempo. Hoje muitos idosos se encontram nessa situação de desânimo e depressão. Espero que essa senhorinha consiga encontrar um bom motivo para ser feliz. Abraços
ResponderExcluirÉ verdade, Beatriz, infelizmente!! Obrigada pelo comentário carinhoso!
ExcluirAbraços!
Emocionante bem como alarmante. O que estamos fazendo pelos nossos idosos? Estão tendo uma vida digna? São gratificados por todos os esforços que tiveram conosco? Precisamos lhes mostrar que a vida continua, que ainda há muito o que viver e que o avanço da idade nada mais é do que acúmulo de sabedoria!
ResponderExcluirAbraços 😊
Que lindo seu comentário, Amilton, amei seus questionamentos, a sua opinião!! Obrigada, abraço!
ExcluirOlá , tudo bem ? que texto tocante , sabe que tenho medo da velhice mais desde já penso em alternativas como viajar , participar de grupos de terceira idade. Acho que devemos ser donos de nossas vidas e fazer nossas vontade enquanto tivermos lucidez . Espero que essa senhora não se entregue aos desejos dos outro e tome rédea de sua própria vida .
ResponderExcluirOlá, Márcia, tudo bem!! Eu também penso como você, gosto de viajar. Participar desses grupos é uma ótima opção!! Sim, sem dúvida!!! Obrigada pelo comentário e carinho!
ExcluirAbraços!
Oi
ResponderExcluirQue lindo conto,tai um belo texto,gosto muito de histórias,continue assim,quero ver mais tá bjs.
Olá, Alzinete, que bom!! Obrigada pelo comentário!
ExcluirAbraços!
Oie
ResponderExcluirLi mais um conto maravilhoso seu, é a pura realidade, conheço mulheres que passam por isso de depois que chega na velhiçe perde o interesse de viver a propria vida, sair, se arrumar. Parabéns pelo posta, beijos
Olá, Ade, muito obrigada pelo carinho e apoio!! Fico feliz sabendo que você gostou do texto!
ExcluirAbraços!
Oi. Gosto muito de ler seus contos, também escrevo e acho conto uma modalidade gostosa tanto para o escritor, quanto para o leitor. Nos seus contos encontro um drama que deixa sempre a história viva. Parabéns.
ResponderExcluirOi, colega, que boa notícia!! Minha irmã disse que sou boa para escrever drama, rsrsrs. Muito obrigada pelo carinho, tenho acompanhado seu trabalho e gosto da sua escrita!
ExcluirAbraços!
Muito bom o tema do seu conto.
ResponderExcluirRealmente é muito ruim a pessoa deixar de fazer suas vontades para satisfazer as vontades dos outros. Tem muitas mulheres por aí que não conseguem viver livremente e que precisam de motivação e muito ânimo para seguir em frente.
Obrigada, Inês, pelo comentário! Gostei muito da sua opinião, concordo com você!!
ExcluirAbraços!
Muito boa reflexão do seu texto. Conheço mulheres que infelizmente passam por isso.
ResponderExcluirbesitos
Obrigada, Iara, pelo comentário!!
ExcluirBesitos!
Uma história que se repete bastante na vida real, e na vida de muitas mulheres.
ResponderExcluirObrigada, Melissa, pelo comentário!!
ExcluirAbraço!
Que historia triste Cidália, é uma pena ver uma pessoa sem esperança ou expectativa de uma vida melhor.
ResponderExcluirDesencantada com tudo e sem animo para viver, totalmente depressiva e solitária.
Bjinhos,
www.prosaamiga.com.br
Sim, Marisa, é muito triste!! Obrigada pelo comentário!
ExcluirAbraços!
Ai meu coração mulher! Adorei a sua história e torço para que a vontade de viver retorne, apesar dos pesares.
ResponderExcluirMuito obrigada, Mari, pelo comentário!! Que bom que você gostou!
ExcluirAbraços!
As tendências mudaram ligeiramente no final dos 30 anos: os homens começam a perder amigos em um ritmo mais rápido. Os homens com idades entre 40 e 44 anos são o grupo demográfico com a taxa mais alta de suicídio, quase quatro vezes o das mulheres da mesma idade.
ResponderExcluirQue coisa mais triste, não é mesmo, Leny? Obrigada pelo comentário!
ExcluirAbraços!
Mais um conto interessante Cidália e quando me dei fė já estava lá no final do conto.É um pouco triste porém Real pois isto acontece exatamente da forma descrita.
ResponderExcluirwww.robsondemorais.blogspot.com.br
Muito obrigada pelo comentário, Robson!! Que bom que você gostou do conto!
ExcluirAbraço!
Confesso que me identifiquei bastante com essa mulher. Ando mais reclusa, mais introspectiva ultimamente e às vezes é difícil sair desse estado de espírito e, como você escreveu, buscar uma vida repleta de cores. Mas a gente vai tentando, isso que importa né? Adorei o conto, você escreve muito bem!! <3
ResponderExcluirPois é, Laura, o mais importante é tentar sempre; não deixar que a tristeza a domine!!
ExcluirObrigada pelo desabafo! Abraços!!
O triste é que existem muitas pessoas como a mulher dessa história. Pessoas que tem medo de viver e apenas sobrevivem. Me encantei com o texto e estou curioso para saber o desfecho.
ResponderExcluirÉ uma triste verdade, infelizmente!! Que bom que você gostou do texto! Obrigada pelo comentário!!
ExcluirAbraço!
Olá Cidália adoro teus contos! Sempre digo para as pessoas que filhos não são garantia de companhia para a velhice. É muito triste mas isto acontece com muitos idosos... A velhice chega, a energia e a saúde vão diminuindo mas mesmo assim temos que tirar o melhor dela! Parabéns pelo conto tão cativante!
ResponderExcluirFico feliz Jaque, sabendo que você gosta dos meus contos!! É a mais pura verdade, afinal os filhos têm a sua vida! Muito obrigada pelo comentário!!
ExcluirAbraços!!
Oi, Cidália. Parabéns pelo texto.
ResponderExcluirMe emocionou mais uma vez com essa história.
Abraço.
Oi, Johany, muito obrigada!!
ExcluirQue boa notícia!
Abraço!
Olá, Cidália. Vi que esse texto faz parte também da seleção dos vários contos que você publicou na postagem mais recente. E gostei muito dele também. É um texto bem imagético, cheio de imagens lindas. Parabéns.
ResponderExcluir- Bjux,
Diego || Blog Vida & Letras ♥ @vidaeletras
www.vidaeletras.com.br
Olá, Diego! Sim, resolvi juntar alguns textos que abordam o mesmo tema. Que bom que você gostou!!
ExcluirObrigada pelo comentário! Abraço!!